A Série Avenida Paulista apresenta a casa do Conde Francisco Matarazzo, provavelmente a mais conhecida da avenida, que era localizada na esquina da Paulista com a Rua Pamplona, no antigo número 83 e que seguiu com sua família até meados dos anos 1980, quando foi demolida.
Com várias imagens pouco conhecidas, contaremos a história em duas partes, a primeira até o final dos anos 30, antes da mansão ser reconstruída e, a segunda até sua demolição e a construção do shopping Cidade São Paulo.
Portão da Villa Matarazzo na Avenida Paulista. Vamos entrar para conhecer?
Depois deste casarão
O primeiro proprietário desta casa foi Francesco Antonio Maria Matarazzo, que nasceu em Castellabate, uma pequena cidade do sul da Itália e que, aos 27 anos, emigrou para o ainda Império do Brasil.
Chegando ao Brasil, estabeleceu-se na cidade de Sorocaba atuando no comércio de secos e molhados onde, tempos depois, abriu uma companhia de produção e comércio de banha de porco. Dizem que ele trouxe da Itália a banha para esse fim. Será?
O site Aventuras da História descreve as origens e a personalidade do empresário:
Francesco Antonio Matarazzo nasceu em 9 de março de 1854, primogênito de nove irmãos. Era filho do médico e comerciante Costabile (falecido em 1873) com Mariangela. O sobrenome familiar, de origem greco-sarracena, significa rocha forte, e o jovem Francesco fazia jus a ele: era musculoso e alto. A calvície prematura o fez optar por raspar os cabelos(…)
Apesar de ser um dos homens mais poderosos de sua época, Matarazzo era simpático. Não era dado a grandes ostentações, ao contrário de alguns de seus descendentes, conhecidos como esbanjadores. Em 1924, em Nápoles, o conde deu provas disso ao encomendar um terno na sua alfaiataria preferida. O alfaiate estranhou, dizendo que um filho do industrial havia passado lá mais cedo e mandado fazer não um, mas seis trajes. Matarazzo não titubeou: “Ele tem pai rico, eu não”.
Ao chegar ao Brasil, aos 27 anos, acompanhado de sua companheira Filomena e de dois filhos, ele já tinha uma década de experiência no comércio. Além disso, trazia consigo economias equivalentes a algo entre 30 mil e 50 mil dólares, em valores atuais – não se fundamenta, portanto, a versão de que Matarazzo teria chegado pobre ao Brasil.
Mas o jovem comerciante perdeu boa parte de seu patrimônio logo ao aportar aqui, em dezembro de 1881. No Rio de Janeiro, por um descuido no desembarque, ele viu naufragar duas toneladas de banha de porco que havia trazido da Itália para vender aqui.
Nos primeiros tempos de Brasil, ele comprava pessoalmente os porcos, extraía e embalava a banha, despachava-a em sua própria tropa de mulas ou a vendia em seu armazém. A produção caseira em poucos anos daria lugar a grandes fábricas, e as mulas seriam substituídas por caminhões e navios”
Em 1890, veio para São Paulo e, com os irmãos Giuseppe e Luigi, criou a empresa Matarazzo & Irmãos e começou a importar farinha de trigo dos Estados Unidos. No ano seguinte, formou-se a Companhia Matarazzo S.A. que já contava com 41 acionistas minoritários.
Em 1900, com dificuldades de importação do produto, Francesco construiu um moinho na cidade de São Paulo. A partir desse momento, seu império empresarial se ampliou velozmente, chegando a reunir 365 fábricas por todo o território nacional, e outros negócios como portos, estaleiros, metalúrgicas, moinhos etc.
O resultado do grupo era um dos maiores do país e, neste período, 6% da população paulistana dependiam de suas fábricas. Em 1911, o conglomerado passou a se chamar Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo (IRFM).
A IRFM foi responsável pelo lançamento de diversos produtos que se tornaram muito populares, como os óleos Maria e Salada e a marca de massas Petybon. A empresa também foi o primeiro representante de vendas dos automóveis FIAT no Brasil. Em 1928, Matarazzo participa da fundação do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP).
Abaixo uma galeria de fotos de anúncios de seus produtos comercializados. Além de mostrar a grandeza de seu império, os anúncios graciosos mostram a cultura de uma época. Arraste ou clique nas setas laterais para ver as imagens.
Em 1920, foi inaugurado o complexo industrial da Água Branca, na Zona Oeste de São Paulo, em uma área com 100 mil metros quadrados. O local caracterizava-se por suas imensas chaminés de tijolos, que podiam ser avistadas a centenas de metros de distância. Este foi o primeiro parque industrial paulista com noção verticalizada de produção
Matarazzo também se fez presente em várias áreas sociais. Foi ele que comprou o Parque Antarctica para o Palestra Itália. Sobre a compra, o site da Gazeta Esportiva conta que:
Em 1920, respaldado pelas Indústrias Matarazzo, o clube comprou o campo de futebol e grande parte do terreno do Parque Antarctica por 500 contos de réis, uma verdadeira fortuna à época. O Palestra Itália, então presidido por Menotti Falchi, se comprometeu a pagar metade do valor à vista e o restante em duas prestações anuais de 125 contos de réis.
Ele também financiou a construção, em 1904, do Hospital Matarazzo, na Bela Vista, nos arredores da Paulista. Trata-se de um conjunto de prédios em estilo neoclássico que foram tombados em 1986, como bem cultural de interesse histórico-arquitetônico. O hospital e a propriedade faliram, encerrando suas atividades em 1993, permanecendo fechado durante 20 anos. Em 2011, o imóvel foi adquirido pelo grupo francês Allard e está em processo de restauração.
Claro que Matarazzo recebeu várias homenagens e títulos, mas a maior veio rei da Itália, Vítor Emanuel III, que lhe concedeu o título nobiliárquico “O Muito Honorável Conde Matarazzo” em reconhecimento aos auxílios milionários, ofertados em dinheiro e mercadorias, que enviava ao país natal durante a Primeira Guerra Mundial.
O site Aventuras da História ainda conta que:
Estabelecido na capital, Matarazzo tratou de resolver uma pendência antiga: aos 41 anos, casou-se com Filomena, em setembro de 1895, numa cerimônia simples. A essa altura, o casal já tinha mais de duas décadas de convivência e nove filhos.
Em três anos, a família se mudou para um enorme palacete, a segunda casa a ficar pronta na recém-inaugurada avenida Paulista. Não havia mais nenhuma dúvida: Matarazzo fazia parte da nata da sociedade paulistana (de sua garagem sairia, no futuro próximo, o elegante Packard, carro com a placa número 1 da frota municipal). Sua importadora não parava de crescer.
Francesco Matarazzo casou-se com Filomena Sansivieri com quem teve 13 filhos: Giuseppe, Andrea, Ermelino, Teresa, Mariangela, Attilio, Carmela, Lydia, Olga, Ida, Claudia, Francisco Matarazzo Júnior, sucessor do fundador, e Luís Eduardo.
Em 1896, a primeira residência Matarazzo começou a ser levantada na Avenida Paulista. Projetada pelos arquitetos italianos Giulio Saltini e Luigi Mancini, em estilo eclético, a casa permaneceu no local até o início dos anos 1940. Na foto abaixo, a casa é mostrada em 1910, imagem publicada no Acervo Iconográfico Pioneiros e Empreendedores – USP.
Outra imagem da casa publicada na Revista Fon Fon já com parte do andar superior.
Anos depois, entre os nos anos 1910 -30, a casa foi adaptada com uma série de mudanças, a partir das aquisições de novos terrenos ao redor e com a construção do nível superior. Nesta primeira fase, a mansão servia como residência do Conde Francesco Matarazzo.
Trazemos uma figura que descreve a cronologia da construção da mansão, que foi publicada com o título “Urna obra brasileira do circolo de Marcello Piacentini: a Villa Matarazzo” de autoria de Marcos Tognon.
Na condição de homem mais rico do país e do italiano mais rico do mundo, com uma fortuna de 20 bilhões de dólares, Matarazzo morre em 10 de fevereiro de 1937, após uma crise de uremia, na época tinha a quinta maior fortuna do planeta. Seu enterro atraiu uma multidão calculada em 100 mil pessoas, numa época em que a população da cidade era de um milhão de habitantes.
Por fim, uma outra Galeria de Fotos de algumas de suas empresas e fábricas espalhadas pelo Brasil.
Arraste ou clique nas setas laterais para ver as imagens.
Para terminar a primeira parte da história, uma homenagem presente no Museo del Mare em Gênova, em que um painel traz à lembrança dos milhares de oriundi que fizeram de São Paulo, como dizia o Conde Francesco Matarazzo, uma cidade filha da Itália.
19 thoughts on “A saga da família Matarazzo e a mansão na Paulista – Parte 1”
fadiga de Cariatides
Lu, ele faleceu em 10 de FEVEREIRO de 1937 e não dezembro…
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Obrigada por avisar. Vou corrigir…..
CurtirCurtir
Betty
Amo estas estórias das casas da Av. Paulista.
Elas me remetem a um tempo que devo ter vivido, pois eu sinto na alma toda a beleza.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Muito obrigada. Ficamos felizes com seu comentário.
CurtirCurtir
Carmem Silvia De Macedo Corrado
Bom dia,
Excelente e deliciosa reportagem.
Quem seria o Conde Matarazzo, que diariamente descia a pé a Rua Pamplona, acompanhado por seu motorista e carro, ao lado, até a Rua Rocha e depois entrava no carro e retornava para casa? Eu ainda criança, morava na Rua Pamplona e o aguardava todas as manhãs para uma conversinha. Kkkkk
Ele era muito simpático e idoso. Início ou meio da década de 60. Obrigada. Abraço.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Provavelmente o Conde Francisco Matarazzo Júnior, filho de Francesco Matarazzo. Contaremos a história dele no próximo texto
CurtirCurtir
fernandoantonioaltomani@gmail.com
SRA. CARMEM, NESSA ÉPOCA, ACREDITO QUE O MOTORISTA QUE VIA SEMPRE ACOMPANHANDO O CONDE FOI UM GRANDE AMIGO MEU E NATURAL DE AMPARO, PEDRO MICHELINI, ELE NOS CONTAVA COMO TOMAVA CONTA DAS CRIANÇAS, ETC… SUA ESPOSA FICOU MUITO DOENTE E ELE PEDIU DEMISSÃO, COMO O CONDE GOSTAVA MUITO DELE, LHE MONTOU EM AMPARO UMA MERCEARIA COMPLETA, DURANTE INICIO DA REVOLUÇÃO LÁ NUNCA FALTOU MERCADORIAS E O CONDE QUANDO IA A SERRA NEGRA OU AGUAS DE LINDÓIA LÁ PARAVA PARA REVÊ-LO, SEMPRE O PÊO COMO CARINHOSAMENTE ERA CONHECIDO ELOGIAVA TODA FAMILIA.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Que bacana a história! Eles eram muito generosos…
CurtirCurtir
M.TTT
Essa mansão sempre povoou meu imaginário, passava diariamente de bonde frente a ela.
.maravilhosa
CurtirCurtir
Alvani Santiago
Sou apaixonada por historia antiga.
Nao sou de Sao Paulo, mas quem nao conhece os Matarazzo’s? Nem que seja de nome.
Que pena que uma historia tao linda acabou, né?
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
É verdade! Uma pena mesmo, a história é muito bacana. Obrigada por ler os textos da Série Avenida Paulista.
CurtirCurtir
Pingback: O Shopping Cidade de São Paulo e a Torre Matarazzo | Série Avenida Paulista
Geraldo
Boa noite
Sou arquiteto e publicitário e estou escrevendo sobre a Publicidade Brasileira no período Dee 1808 até 1918.
Um dos capítulos fala da influências dos italianos, sua imprensa e seus anúncio, onde Matarazzo é super importante.Vcs tem alguns anúncios dos produtos/empreas Matarazzo do período?
Ou sabem onde posso obter-los?
Desde já grato
Geraldo Alonso
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Olá, Geraldo, como vai? Respondi sua mensagem por email. Abraços
CurtirCurtir
Jus Brandao de castro
So seu que o Eduardo Suplicy e um Matarazzo…..
CurtirCurtir
marco machado
Excelente trabalho de história…Desenvolvo um trabalho a mais de vinte anos com Tijolos Antigos…tenho vários exemplares de tijolos com a sigla IRFM…e a pergunta que está sem resposta até hoje é…o Matarazzo tinha uma olaria…oficialmente, não…mas gostaria de ter certeza…de todas as listas oficiais de tudo que ele produzia e de todas as suas empresas não consta uma olaria de tijolos…bom, caso alguém saiba, por favor compartilhe…grato.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Olá, Marco, muito obrigada. Nossa que bacana. Sim eles tinham uma olaria. Existe uma página no facebook sobre as Industrias Matarazzo, que escreveu “até o final da década de 1940 a Matarazzo produzia tijolos em suas olarias na cidade de São Paulo e Guarulhos. Com a inscrição IRFM (Indústrias reunidas Fábricas Matarazzo) estes tijolos serviam basicamente para edificações da própria IRFM e também para a Família Matarazzo como o tijolo da foto, localizado durante escavações das fundações do atual Shopping Cidade São Paulo”. O autor da página, Everton Calício, conhece tudo dos Matarazzo: Segue link: https://www.facebook.com/industriasmatarazzo/about/?ref=page_internal
CurtirCurtir
Pingback: A saga da família Matarazzo e a mansão na Paulista – Parte 2 | Série Avenida Paulista
Katia de Almeida
Minha tia Francisca de Almeida (Chiquita) trabalhou para os Matarazzo
CurtirCurtido por 1 pessoa