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  • Série Palacete Camasmie – Parte 2: A Construção

    Posted at 18:29 by Luciana Cotrim, on setembro 21, 2019

    No artigo anterior, a Série Avenida Paulista iniciou uma nova “série dentro da série”. Estamos contando a história do palacete que ficava quase na esquina da Avenida Consolação que pertenceu a Taufik Camasmie. A Série recebeu o nome de Série Camasmie, Loeb e Comolatti e, se quiser ler a primeira parte, clique aqui.

    Depois deste casarão

    Edifício Grande Ufficiale Evaristo Comolatti

    Avenida Paulista, 2.457


    Como já dissemos, a reconstituição desta narrativa, só foi viável pela gentil colaboração de uma descendente da família: a Marcia Camasmie Dib, bisneta do Sr. Taufik. O trabalho escrito por Marcia, intitulado Produzindo o Ecletismo: estudo de um caso da avenida Paulista (1975-1985) descreve como aconteceu a construção do palacete, do ponto de vista dos artistas, operários e artesãos que trabalharam na obra. 

    Será este enfoque inusitado, de reconhecimento a todos os trabalhadores, que mostraremos hoje, com trechos originais da pesquisa de Marcia.  Vale salientar que os artesãos e seus descendentes também contribuíram com a pesquisa, oferecendo informações e realizando depoimentos. História viva!

    Esta foto acima mostra parte dos trabalhadores que participaram da construção da residência. O texto de hoje é em homenagem a todos eles.

    Começamos com um depoimento, original do trabalho de pesquisa, que Demétrio Taufik Camasmie, filho de Taufik, fez à Marcia em 1987, rememorando como aconteceu o início da construção do palacete.

    Com essa decisão, e o empenho de todos, a família resolveu fazer o melhor para a residência que duraria gerações. Os melhores fornecedores de São Paulo, e até da Europa, foram contratados. Existiam outros moradores árabes na Avenida Paulista e, claro, a casa dos Camasmie tinha que ser tão boa quanto a dos compatriotas. Por isso, alguns dos contratados eram comuns nas casas dessas famílias.

    É o caso do engenheiro Malta, da empresa Malta & Guedes, de propriedade dos politécnicos formados em 1914, Francisco de Salles Malta Jr e Henrique Jorge Guedes, que também foram responsáveis pelos projetos das mansões de Nagib Salem, na mesma avenida, e de David Jafet, no bairro do Ipiranga.

    Os escritórios mais reconhecidos do país foram contratados para realizarem o maravilhoso acabamento do palacete, iniciamos pela entrada da casa, na Avenida Paulista.

    Fachada projetada pelo serralheiro italiano Frederico Puccinelli

    A fachada principal da casa, com o belo portão que dava para a calçada da avenida (na imagem podemos ver até os trilhos do bonde), foi projeto do serralheiro italiano Frederico Puccinelli, um artífice, imigrante, que se tornou professor do Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, pelas mãos de Ramos de Azevedo, trazendo-lhe notoriedade e reconhecimento na época. 

    Vencidos alguns degraus, chegava-se à porta principal que vemos abaixo e que foi, também, um trabalho meticuloso em ferro, realizado por ele.

    Uma das marcas próprias desta residência era o imponente mirante, que se destacava pela linda cúpula de cobre, que ganhava a cor verde, por conta do contato do cobre com o clima. Talvez seja por essa parte da casa, que a construção seja reconhecida por muitos de nós. Quem não se lembra dessa cúpula maravilhosa que reinava entre a Avenida Paulista e a Consolação?

    Agora, imaginem lá pelos anos 1930, quem estava no mirante tinha o privilégio de observar o horizonte, entremeado pelas montanhas paulistanas. Consegue visualizar? Então, veja na foto abaixo, grandes áreas sem nenhuma casa ou edifício próximos à Avenida Paulista. Mais ainda, ao fundo, a linha das montanhas que marcam o horizonte, como parte da visão da moldura trabalhada do mirante. 

    Entremos para o interior da residência. Para melhor acompanhamento do trabalho realizado pelos profissionais, abaixo podemos ver a planta do piso principal do palacete Camasmie. Várias salas, duas delas especialmente nomeadas conforme o estilo: a sala Luis XV, na qual predominava os ornamentos dourados, e a Luis XVI, uma sala de música, onde ficava o piano.

    A planta foi desenhada para o trabalho da faculdade, a partir das memórias da mãe da Marcia

    Nos principais ambientes sociais havia grandiosos vitrais, belíssimos, que eram de autoria de Conrado Sorgenicth Filho, da famosa Casa Conrado Sorgenicth, muito requisitada naquele período. A empresa foi fundada em 1889 pelo alemão Conrado Sorgenicht (1835-1901), que havia desembarcado no país catorze anos antes, depois do fim da Guerra Franco-Prussiana.

    Em sua empresa produziam-se vitrais nacionais como os que eram importados da Europa. A revista Veja São Paulo publicou que “Entre os anos 20 e 30, a arte em vitrais viveu seu primeiro auge na cidade. O quase monopólio da Casa Conrado se deveu, em parte, a uma parceria com o engenheiro e arquiteto Ramos de Azevedo. Além de ilustrar os vitrais do Mercadão, Conrado Filho executou as obras do Palácio das Indústrias, de 1924, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco e do Hospital Beneficência Portuguesa”.

    O mais magnífico dos vitrais do Palacete Camasmie é descrito por Marcia, em seu trabalho: “como um vitral colorindo de alto a baixo, dando um aspecto deslumbrante ao aposento. Toda área social era raramente usada, somente nas ocasiões de festas”.

    A fotografia, muito antiga, deixa a desejar, mas podemos imaginar o quão belo era esse alto vitral que “recebia” as visitas da residência. Além disso, ele guardava uma memorável história de família, que remetia à tradição e cultura patriarcal dos árabes.

    Vejam que na parte superior da obra é mostrado um príncipe, montado em seu cavalo. Pois bem, Marcia conta essa lenda em seu trabalho:

    Não é intrigante? Acontece que o Sr. Camasmie era precavido. Imagine se uma das filhas se inspirasse nesse desenho e resolvesse fugir de casa com algum pretendente. Melhor não…

    No jardim de inverno mais um outro belo vitral da Conrado Sorgenicth. Ao lado dele, na casa já sem mobília, vê-se uma pintura inspirada no Jardim de Versailles, da França.

    Na sala de jantar um outro lindo vitral com motivos de flores e frutas, era adornado por lambris e a cristaleira projetadas por Domênico Penso, como se pode observar na foto abaixo. Ele foi responsável pelo projeto e construção dos móveis de madeira escura que mobiliaram a casa.

    A residência foi toda construída e decorada em estilo eclético. Muito do que se fazia na Europa era replicado no Brasil, com era o caso dos vitrais. Mas, sendo uma casa tradicionalmente síria, a cultura e decoração mourisca também era muito evidenciada nos alicerces da moradia, principalmente nas paredes e nos itens de acabamento da casa.

    Os formatos arredondados das paredes, pintadas de cores vivas – azul, verde, roxo, amarelo e vermelho – na variedade de pinturas decorativas, muito detalhadas, remontam à cultura árabe.

    Abaixo, detalhes do balcão do piso superior. Esse estilo de construção, com inspiração mourisca, pode ser conferido nas segunda e terceira fotos. As faixas decorativas, pintadas no teto, eram feitas com moldes por Ernesto Frioli, autor também de pinturas do Teatro Municipal e do Palacete Rosa, construído pela família Jafet no Ipiranga. Frioli foi professor de muitos pintores brasileiros e estrangeiros.

    Ernesto Frioli fez muitas pinturas no palacete Camasmie, de diversas formas e estilos, destacamos abaixo a bela figura de mulher, em que Frioli procurou retratar uma das filhas do proprietário.

    O projeto das portas era de autoria do marceneiro italiano Romano Guaraldi, que talhava a madeira com presteza. Todas tinham lindos detalhes talhados na madeira, que era colocado no batente da parte superior das portas. A primeira imagem mostra uma porta com duas folhas, que dava para o hall do palacete.

    É muito impressionante a riqueza de detalhes em todos os ambientes sociais da casa. O melhor daquilo que havia disponível à época foi utilizado na construção do palacete. Os melhores artesãos foram chamados para realizar o que de mais sofisticado e belo poderia ser feito por cada um deles. A casa era uma grande demonstração conjunta dos melhores artífices, com profusão e pluralidade de trabalhos específicos e estilos ornamentais.

    Hoje podemos reconhecer isso pelas imagens que restaram do palacete, mas nem sempre foi assim. O que ficou conhecido como estilo eclético, predominante naquela época e em muitas outras residências de nossa história, muitas vezes, foi considerado pouco importante como memória. Marcia, em conversa conosco, faz uma reflexão sobre esta questão. Ela disse: 

    Em relação à construção é legal comentar essa questão do ecletismo, pois na época em que decidi fazer esse trabalho, não existia interesse nem no tombamento e nem por parte dos próprios arquitetos que desprezavam um pouco esse estilo e, hoje em dia, as casas são super ecléticas. É interessante isso: um estilo que foi tão desprezado, no fundo é tão contemporâneo, porque ele reproduz essa sociedade tão miscigenada, essas várias influências das grandes cidades.

    E isso é São Paulo, não é mesmo? E era também o Palacete Camasmie. Para termos uma ideia de quão diversificada era a residência da família, vejam o recorte de quatro lustres existentes na casa: cada um deles apresenta um estilo e características próprias, com  uma perfeita execução.

    Várias cores e formas, diferentes desenhos e técnicas. A diversificação fica evidente na visão conjunta: a bela aplicação em relevo da primeira imagem, o uso do dourado no fundo branco na segunda, a inspiração mourisca, com luminária compondo o conjunto, na terceira figura e, na quarta imagem, o entalhe emoldurando a pintura delicada. 

    É a pura mistura que caracterizada o estilo eclético, mistura que também está em nós, paulistanos e brasileiros, únicos, pela miscigenação de todas as origens de todos os continentes do planeta.  Como dizemos atualmente, o melhor é tudo junto, misturado!

    O palacete Camasmie enobreceu a Avenida Paulista durante 40 anos. É pena que ele não esteja mais lá, como um centro cultural, memória de nosso patrimônio, para que todos pudessem adentrar e visitar cada um de seus ambientes. 

    Apesar disso, é com grande satisfação que compartilhamos o que ainda existe de memória deste lindo exemplar de residência paulistana de meados do século passado. Como já registramos, isso só se tornou possível pela delicadeza de Marcia que permitiu a publicação. Além dela, temos que agradecer também àqueles que nos possibilitaram ver esses registros fotográficos: Eduardo Camasmie Gabriel e Pedro Camasmie Gabriel que produziram as fotos e um álbum com todas as riquezas da casa, como nesta foto da capa em que aparece o teto do hall de entrada da casa e a claraboia e suas assinaturas.

    Em um lindo álbum, daqueles em que as fotos são cobertas com uma folha transparente colante, todas essas imagens já sofrem com o tempo, pois foram tiradas há mais de 30 anos. Suas cores já estão alteradas, algumas embaçadas, mas, ainda bem, foi possível torná-las digitais para serem publicadas aqui e serem eternizadas. Que maravilha para nós, não é mesmo?

    No próximo artigo, contaremos mais sobre a convivência familiar no palacete Casmasmie. Acompanhem!


    Contribua com a Série Avenida Paulista: se tiver uma foto antiga em que este casarão/edifício/local público apareça ou se conhecer alguém que possa fornecer mais informações sobre a residência ou edifício e pessoas relacionadas (família, amigos e outros), entre em contato com a gente. Muito obrigada!

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    Autor: Luciana Cotrim

    Instagram: @serieavenidapaulista Facebook: facebook.com/serieavenidapaulista Use: #serieavenidapaulista
    Postado em Casarões | 4 Comentários | Marcado Casa Loeb, Conrado Sorgenicth, Demétrio Taufik Camasmie, Edifício Grande Ufficiale Evaristo Comolatti, Ernesto Frioli, Frederico Puccinelli, Malta & Guedes, Taufik Camasmie |

    4 thoughts on “Série Palacete Camasmie – Parte 2: A Construção”

    • Avatar de Walter Petinelli Junior

      Walter Petinelli Junior

      22 22America/Sao_Paulo setembro 22America/Sao_Paulo 2019 às 21:38

      Sempre um trabalho maravilhoso.
      Parabéns 👏👏👏👏👏

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      Responder
      • Luciana Cotrim

        22 22America/Sao_Paulo setembro 22America/Sao_Paulo 2019 às 22:30

        Walter, Muitíssimo obrigada, Luciana

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        Responder
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      A Série Avenida Paulista conta as histórias dos casarões e das famílias que moravam na avenida e, também, dos edifícios que foram  construídos em seus lugares.

      Escrita por Luciana Cotrim, a série conta a história de mais de 80 casarões do século XX e dos edifícios atuais.

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