Apresentamos o palacete de Horácio Sabino, considerado, um dos principais urbanistas de São Paulo, que residia onde hoje é o Conjunto Nacional, em umas das esquinas mais emblemáticas da cidade: Avenida Paulista com a Rua Augusta.

Depois deste casarão
Conjunto Nacional
Av. Paulista, 2.073
A história familiar de Horácio Sabino é muito rica e envolvente e, por isso, vamos voltar um pouco no tempo. O pai dele chamava-se Ricardo Leão Sabino, nasceu em abril de 1814, em São Luís no Maranhão.
Ricardo era filho de um português que foi enviado por seu país para prestar serviços no Maranhão: o desembargador Joaquim José Sabino de Resende Faria e Silva. A mãe chamava-se Josepha Adelaide Belfort, era filha do “Lord” Philip Belfort, um engenheiro inglês, e de Adelaide Mattos.

No período em que foi militar, Ricardo participou da revolta da Balaiada, lutou por muito tempo, mas com gênio muito forte, se desentendeu com diversos militares. Neste período de combate, conheceu aquele que seria o futuro Duque de Caxias. Vitorioso moral e militarmente, Ricardo Leão Sabino, entretanto, saiu financeiramente pobre dessas batalhas. Com sua mulher portuguesa teve uma filha, mas enviuvou e casou-se mais duas vezes, e teve muitos filhos.
Depois dos anos de serviço militar, Ricardo Sabino e a família tiveram uma vida difícil, trabalhavam para ter o que comer no dia seguinte. Quando mais velho, com os filhos já crescidos e encaminhados, quis rever os lugares por onde passou, por isso, fez um pedido a seu filho Horácio Belfort Sabino, que o mandasse para Portugal. Ali, em Lisboa, já surdo, quase cego e doente de pneumonia, veio a falecer em 17 de abril de 1902, seis dias após completar 88 anos. Depois, seus restos mortais foram trasladados para o Brasil.
Neste período, Horácio Sabino, que era homem de espírito empreendedor, já era um conhecido empresário e considerado um dos grandes responsáveis pela urbanização de São Paulo. Oriundo de uma família pobre e sem posses, como chegou a tal envergadura?
Vamos à sua história: Horácio Sabino nasceu em Florianópolis, Santa Catarina, em 1869 e se transferiu para São Paulo ainda bastante jovem. Na cidade cursou Direito na Faculdade do Largo São Francisco. Um dos caminhos que lhe abriu muitas portas foi ter estudado e exercido a taquigrafia.

Como taquígrafo, atuou na primeira Constituinte da República, na Constituinte do Rio de Janeiro e no Congresso Legislativo de São Paulo. Prestava muitos serviços na área, com preços e qualidade maiores do que os da concorrência, para isso fez uso de uma habilidade que se tornou uma vantagem competitiva e seu diferencial: entregava um discurso taquigrafado em 24 horas para a revisão dos autores.
Estando no ramo da escrita, nos anos 1890, Sabino passou a editor de livros pela editora que criou e que recebeu o seu nome. Publicou obras de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934) e da poetisa Francisca Júlia da Silva (1871-1920), que era conhecida como a “musa impassível”, homenageada por escultura homônima de Victor Brecheret. O livro de sonetos “Mármores”, de Francisca Júlia, custeado pelo editor, foi recebido com grande furor pela sociedade paulistana.
De 1894 até 1901, em sociedade com José G. de Arruda Leite, Sabino foi proprietário da Typographia Paulista.

Após este período e de advogar por um tempo, Horácio Sabino empreendeu esforços e investimentos na urbanização de São Paulo. Primeiramente, como sócio da Companhia City e, em seguida, à frente da Companhia Cidade Jardim, responsável pela urbanização dos arredores do Jockey Club de São Paulo.

Na época, a sede do então hipódromo da cidade de São Paulo, já não conseguia atender a toda a demanda de seus associados. Com os rumores da necessidade de um novo hipódromo para o Jockey Club Paulistano, anos depois, a Companhia doou ao Jockey Club de São Paulo um terreno de 600.000 metros no então descampado que ficava às margens do Rio Pinheiros para que construísse no local sua pista de corrida.

E como surgiu o enorme palacete da Avenida Paulista?
Como proprietário de terras herdadas de seu sogro, Afonso Augusto Milliet, dentre elas um quarteirão inteiro na Avenida Paulista, Horácio Sabino construiu uma mansão com todo o requinte, entre 1902 e 1904. Com projeto de Victor Dubugras, a residência ocupava grande área desta quadra da Avenida Paulista. A casa foi um exemplo da profunda capacidade arquitetônica e projetiva do famoso arquiteto deste período.

No artigo Victor Dubugras, arquiteto dos caminhos, Alex Miyoshi analisa a casa de Horácio Sabino. Retratamos abaixo uma parte desta análise, editada do original, que discorre sobre o palacete:
“A leveza estava nos arcos, frontões, balaustradas e arremates das colunas das varandas. (..)
A solução de Dubugras é menos abstrata, mimetizando francamente raízes vegetais que penetram nas colunas, com ramagens e flores desabrochando nos capitéis (…).A obra de Dubugras configurou-se numa proposta de elegante rusticidade, inovadora ao ambiente paulistano.
Se a sua preocupação com a racionalidade foi grande, segundo afirmavam os estudantes da Politécnica, ela não era menor com os detalhes de ornamentação, caixilharia e mobiliário. Dubugras tinha o deleite e o gosto apurado para as formas diversas e inusitadas”.

Como mencionamos, Sabino possuía extensa gleba de terra na região e, por isso, lançou o bairro Jardim América, nome dado em homenagem à sua esposa, América Milliet.
No texto intitulado Jardim América, o subúrbio jardim em versão brasileira, o autor Tito Flavio Rodruides de Alencar conta a história da Cia. City:
Conhecida como Cia. City, a City of São Paulo Improvements and Freehold Land Company Limited foi organizada em 1911, com escritórios em São Paulo, Londres e Paris, associando o arquiteto Joseph Bouvard e o banqueiro Édouard Fontaine de Laveleye, ambos franceses, a um grupo de investidores e proprietários de terras nos arredores de São Paulo, integrantes da elite paulista e com acesso franco à cúpula político-administrativa do estado. Cincinato Braga, político paulista, Horácio Belfort Sabino, advogado e proprietário de terras, e Victor da Silva Freire, professor da Escola Politécnica e diretor de Obras Públicas da Prefeitura de São Paulo, estiveram ligados ao início da atuação da Cia. City.

Com os capitais reunidos, a Cia. City comprou aproximadamente 12 km² de terras nas vizinhanças das áreas que já vinham sendo ocupadas pelas camadas altas da sociedade local. Constituída, a companhia iniciou a urbanização de partes dessas terras e a venda dos lotes, entrando no movimentado mercado imobiliário paulistano.
Ainda hoje a Cia. City é atuante nesse mercado e seu sucesso derivou, em grande medida, das estratégias inovadoras e bem traçadas que marcaram seus primeiros anos.
Em homenagem a Horácio Sabino, seus tataranetos fundaram a imobiliária Cidade Jardim Negócios Imobiliários. No site da empresa estão publicadas algumas imagens e informações do empresário, que apresentamos abaixo.
Com sua experiência em urbanização, tinha como preocupação oferecer uma alta qualidade de vida aos moradores, por meio de residências instaladas em amplos terrenos ajardinados, dispostos em ruas arborizadas e traçado curvilíneo, implantando assim o conceito Cidade Jardim. O objetivo era garantir a qualidade ambiental, sanitária e visual dos imóveis que ali seriam erguidos. Assim as obras iniciaram-se em 1913, terminando quase duas décadas depois, em 1929.

A Avenida Cidade Jardim, bem como outras ruas adjacentes, foram abertas na década de 1920. Em 1926, a avenida já estava aberta e regularizada. Nesse mesmo ano, a Prefeitura tornou-a oficial através da Lei 3.018, que dizia em um artigo: “Na forma da lei, da Companhia Cidade Jardim ou a quem de direito, para ser incorporada ao domínio público do Município, e entregue ao uso comum do povo”.
À área de terreno constituído pelo leito do trecho de rua que vai da extremidade da Avenida Europa até a Rua Iguatemi (atual Brigadeiro Faria Lima), segundo a planta, deu-se a denominação de Avenida Cidade Jardim.
A Cia City foi responsável pela criação de vários outros bairros se São Paulo como o Butantã, Jardim América, Alto de Pinheiros, Pacaembu entre outros, neste último a Companhia doou uma área para a cidade construir o estádio Paulo Machado de Carvalho, o Estádio do Pacaembu.


Muitos novos bairros foram planejados e incorporados por Horácio Sabino e a Companhia City como podemos ver nos anúncios abaixo.






Horácio Belfort Sabino, o homem que empresta seu nome a uma praça em Pinheiros, na zona oeste, morreu em 1950. Sua mulher, América, morreu 15 dias depois. Sua história foi escrita no livro da Editora A&A Comunicação, intitulado Horácio Sabino – Urbanização e Histórias de São Paulo, escrito por Carolina Andrade com pesquisa de Ana Carolina Layara Glueck – ambas bisnetas de Sabino.
Demolido em 10 de junho de 1953, o palacete deu lugar a outro ícone paulista: o Conjunto Nacional.

Nos próximos dias será publicada uma linda surpresa: a história sobre o casarão e a vida de Horacio Sabino, escrito por uma de suas bisnetas. Não percam!
Fiquem com um lindo desenho feito em aquarela da casa de Horacio Sabino, projetada por Victor Dubugras.
Contribua com a Série Avenida Paulista: se tiver uma foto antiga em que este casarão/edifício/local público apareça ou se conhecer alguém que possa fornecer mais informações sobre a residência ou edifício e pessoas relacionadas (família, amigos e outros), entre em contato com a gente. Muito obrigada!
One thought on “O palacete de Horácio Sabino”
Pingback: Preciosas lembranças e fotos inéditas de Horácio Sabino, sua família e o palacete | Série Avenida Paulista